29 de out. de 2010

Oficina de Conceitos [Sílvia Faustino de Assis Saes]

A “oficina de conceitos” é uma proposta pedagógica que parte do princípio de que a Filosofia é, antes de tudo, uma atividade de investigação dos conceitos que caracterizam a racionalidade humana. Uma “oficina de conceitos” é uma exposição dos resultados dessa atividade de estudo, pesquisa ou investigação. É como uma “instalação” em que o espectador pode de algum modo participar, entrar no processo de construção e uso do conceito.
A atividade de estudo dos conceitos filosóficos, que serve de base para a “oficina de conceitos”, não deve ser monográfica, isto é, não deve envolver os conceitos trabalhados apenas por um filósofo ou por uma única obra filosófica. A pluralidade de abordagens deve ser privilegiada, pois a “oficina de conceitos” privilegia o processo de formação, construção, modificação (e perecimento) dos conceitos filosóficos.
Na “oficina de conceitos”, deve ser exposta a possibilidade de um alcance e aplicação do conceito que possa legitimamente extrapolar o campo da filosofia pura. Exemplos: o conceito de justiça, que pode ser aplicado no direito e na política; o conceito de mente, que pode ser útil no campo da psicologia, das ciências biológicas, ou neuro-ciências; o conceito de matéria, que está presente nos fundamentos da física, da química etc.; o conceito de valor, tal como é trabalhado nos distintos campos da ética, das artes e da economia; e assim por diante. A “oficina de conceitos” deve poder refletir e propiciar a abordagem interdisciplinar dos conceitos filosóficos.
Trata-se de uma ‘oficina’ no sentido em que o tratamento dado a um conceito privilegiará aspectos fundamentais de sua construção, seja numa abordagem mais histórica, seja numa mais sistemática. As perspectivas da história e do sistema podem ser combinadas na oficina, uma vez que se combinam na própria filosofia. Ou seja: um mesmo conceito pode ser exposto em sistemas e períodos históricos variados, desde que o espectador possa estabelecer analogias, comparações, identificar semelhanças ou contraposições de sentidos etc.
Numa “oficina de conceitos”, os conceitos não são dados como prontos ou acabados: mesmo que se parta de uma definição específica dada por um filósofo determinado — o que é um excelente ponto de partida — outros filósofos e vertentes deverão comparecer, para que sejam mostrados diferentes aspectos, propriedades ou funções daquele conceito em questão. Assim, por ex., se o conceito de “livre-arbítrio” começa a ser mostrado a partir de Agostinho, ao lado deste conceito inaugural no ocidente, poder-se-á mostrar, por ex., a visão que Schopenhauer tem do livre-arbítrio. Aspectos dissonantes, tensões conceituaisinteressam sobremaneira à “oficina de conceitos”. Um filósofo lança um conceito, um outro vem e se apropria dele e o modifica, outro se apropria e o desenvolve às vezes numa direção impensada pelos dois primeiros. Os filósofos e seus escritos se mobilizam a favor dos conceitos, contra os conceitos, etc… A “oficina de conceitos” não se destina a explicar, mas tão-somente expor as tensões e os conflitos de significados dos conceitos.
As “oficinas de conceitos” são exposições, instalações, feiras que convidam o espectador para a aventura do pensamento acerca da racionalidade humana e das formas de vida possíveis no mundo. Suas formas de apresentação e de representação devem ser múltiplas, criativas. Os recursos da técnica e de todas as artes devem ser utilizados.
É desejável que essas “oficinas” se dediquem aos conceitos de todos os tempos da filosofia, desde que, de algum modo, o espectador do século XXI possa, por meio dos conceitos apresentados, reconhecer problemáticas pungentes da racionalidade contemporânea.



(Uma proposta de Sílvia Faustino de Assis Saes)

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